A aprovação da primeira fase da reforma tributária (ou seja, da Proposta de Emenda Constitucional nº 45/19) pela Câmara dos Deputados gerou grande repercussão e rendeu muitas discussões cujo propósito era o de detalhar o novo imposto de bens e serviços (IBS) e a contribuição sobre bens e serviços (CBS), substitutos do ICMS e ISS e do PIS e Cofins, respectivamente.
Superado o frenesi inicial com o alegado marco histórico, fato é que a PEC nº 45/19 segue em tramitação no Senado, de modo que não há quaisquer certezas sobre o tema até o presente momento.
De todo modo, caso a PEC venha a ser aprovada, para além da mudança nos impostos sobre o consumo, ela poderá impactar os tributos sobre o patrimônio, como é o caso do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD).
É dizer, a reforma tributária, por meio da PEC nº 45/19, poderá desde logo afetar a tributação do patrimônio das famílias, em que pese a divulgação majoritária desta primeira fase da reforma como se restrita ao consumo fosse.
Em relação ao ITCMD, as principais mudanças consistem 1) na inclusão do inciso VI no artigo 155 da Constituição que torna impositivo o comando de que as alíquotas do imposto sejam progressivas em razão do valor da transmissão ou da doação e 2) na autorização para que os estados passem a cobrar o imposto sobre doações realizadas por residente no exterior e sobre heranças deixadas por falecido no exterior ou inventários processados no exterior, mesmo que pendente a edição de lei complementar sobre a matéria (tal qual previsto no artigo 16 da PEC em comento).
Ambas as previsões, portanto, tendem a impactar diretamente as famílias que pensam ou planejam realizar o planejamento sucessório e patrimonial.
Hoje, nove estados da federação nacional, dentre os quais Paraná e São Paulo, ainda adotam alíquotas fixas para o ITCMD, sendo estas alíquotas inferiores ao teto fixado na Resolução do Senado nº 9/1992. Nos termos da Resolução vigente, a alíquota a ser fixada em lei estadual, poderia ser progressiva até o máximo de oito por cento.
A reforma proposta, contudo, altera a faculdade então vigente para impor aos estados o dever de estabelecer alíquotas progressivas para o tributo, de modo que — especialmente nos estados que hoje adotam alíquota fixa inferior à máxima — a mudança legislativa tende a resultar no aumento do ITCMD.
Vale lembrar que em dez estados, como é o caso do Rio de Janeiro e de Santa Catarina as alíquotas atuais já chegam ao máximo permitido pela Resolução vigente. Não obstante, em paralelo à reforma tributária, o Projeto de Resolução do Senado nº 57/2019, de autoria de Cid Gomes, propõe o aumento da alíquota máxima do ITCMD para o patamar de dezesseis por cento, o que pode levar ao aumento generalizado do tributo em território nacional.
O projeto em questão foi apresentado pelo Senador com a justificativa de “atenuar o atual quadro de dificuldades financeiras por que passam os governos subnacionais”. A justificativa do projeto apenas menciona o princípio da capacidade contributiva — segundo o qual os impostos devem ser graduados de acordo com a capacidade econômica do contribuinte — de modo subsidiário, deixando flagrante a atual saga arrecadatória do Estado como principal motivador da pretensa reforma.
Projetos como este reforçam a percepção de que a janela para aproveitar as alíquotas atuais de ITCMD está se encerrando para aqueles que buscam evitar custos desnecessários ao cogitar de doações e demais transmissões patrimoniais.
Outra mudança prevista na PEC nº 45/19 consiste em fixar a competência para recolhimento do ITCMD na unidade da federação onde era domiciliado o falecido, ao se tratar da transmissão de bens móveis, afastando, assim, a prerrogativa de escolha de alíquota mais favorável pelo contribuinte que, hoje, em regra, pode definir o local de processamento do inventário extrajudicial e, com isso, escolher alíquota que lhe seja mais favorável.
Por fim, a PEC afasta a incidência do ITCMD sobre as transmissões e as doações para as instituições sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social, inclusive as organizações assistenciais e beneficentes de entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos, incentivando, assim, a transferência patrimonial para estas instituições.
Por Maria Eduarda Kormann
Fonte: Conjur