TJSP adota valor patrimonial contábil para cálculo do ITCMD

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) decidiu, por maioria, que a base de cálculo do ITCMD incidente sobre a doação de cotas de uma sociedade limitada de natureza familiar deve ser apurada com base no valor patrimonial contábil, e não no valor de mercado ou venal, como pretendia a Fazenda do Estado de São Paulo. A decisão foi proferida pela 9ª Câmara de Direito Público e representa um importante precedente para operações envolvendo planejamento sucessório por meio de Holdings Familiares.

A peculiaridade deste caso estava no fato de que o patrimônio líquido da empresa — aproximadamente R$ 4 milhões — era inferior ao seu capital social, fixado em R$ 6 milhões. Tal situação inviabilizou o recolhimento do imposto diretamente no sistema da Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz-SP), que exige o preenchimento com base no valor de mercado. Foi necessário um Mandado de Segurança buscando o reconhecimento do direito de utilizar o valor patrimonial contábil como base de cálculo.

A controvérsia central resultou da interpretação da Fazenda Pública do Estado de São Paulo, que defende a aplicação dos parâmetros previstos na Constituição Federal e no art. 38, do Código Tributário Nacional (CTN), que estabelece o valor venal como base de cálculo dos impostos sobre transmissão. Por outro lado, os contribuintes entendem que deve prevalecer a regra específica da Lei Estadual nº 10.705/2000, que rege o ITCMD em São Paulo, que define como base de cálculo o “valor venal do bem ou direito transmitido” (art. 9º), complementado pelo art. 14, que traz exceção relevante: quando se trata de ações ou quotas de sociedades que não sejam objeto de negociação no mercado ou não tenham sido negociadas nos últimos 180 dias, admite-se a utilização do valor patrimonial.

Na decisão, o Desembargador Décio Notarangeli, relator do acórdão, destacou que, embora não haja definição expressa na legislação sobre o conceito de valor patrimonial, a jurisprudência do próprio TJSP já consolidou o entendimento de que, nas hipóteses como a dos autos, aplica-se o valor patrimonial contábil líquido. Esse valor corresponde ao resultado da divisão do patrimônio líquido da sociedade pelo número total de cotas, devidamente atualizado até a data do fato gerador.

O TJSP tem mantido esse entendimento desde 2022, com decisões semelhantes proferidas também nas 8ª, 10ª e 13ª Câmaras de Direito Público.

Do ponto de vista prático, especialistas em direito tributário apontam que a fixação do valor de mercado de uma holding familiar é tarefa complexa e, muitas vezes, subjetiva, uma vez que tais sociedades não possuem ações negociadas em bolsa nem intenção de venda dos ativos. Segundo eles, a constituição de holdings familiares constitui instrumento legítimo de planejamento patrimonial e sucessório, que visa facilitar a gestão de bens e evitar os custos e a burocracia da transferência direta de imóveis, veículos e outros ativos.

O julgamento também evidencia o constante embate entre os contribuintes e a Fazenda Estadual, refletindo uma postura cada vez mais rigorosa dos fiscos estaduais na tentativa de ampliar a arrecadação. Essa litigiosidade, no entanto, gera insegurança jurídica, uma vez que, embora haja precedentes favoráveis, cada caso é analisado de forma individual, o que impede a completa eliminação de riscos.

Outro ponto relevante do debate diz respeito à escolha do balanço contábil a ser utilizado para apuração do imposto. Enquanto a Fazenda defende a utilização do balanço mais recente — mesmo elaborado após o fato gerador —, a jurisprudência tem admitido que o contribuinte utilize o balanço patrimonial regularmente escriturado e atualizado até a data da doação, evitando, assim, critérios arbitrários que majorariam a base de cálculo sem respaldo legal.

A constituição de uma Holding Familiar, seguida das movimentações para efetivação do planejamento sucessório são tarefas que devem ser acompanhadas por advogados especializados, uma vez que podem resultar em cobrança de impostos acima do exigido em lei, diminuindo sua eficácia tributária.

Bruno Burkart (OAB/SP 411.617)
Sócio do escritório Freire & Burkart Advogados

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