Texto da reforma tributária não garante que teto para alíquota do IVA será cumprido

Um dos principais pontos da proposta de regulamentação da reforma tributária aprovada pela Câmara dos Deputados na noite de quarta-feira (10/7) é a trava para evitar que a alíquota do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) seja maior do que 26,5%. Para os advogados tributaristas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico, a ideia é boa, mas, na prática, gera incerteza, pois não há a garantia de que um eventual descumprimento do teto será corrigido.

O teto tributário foi inserido no artigo 465 do Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/2024. Segundo esse dispositivo, a soma das alíquotas de referência do IBS e da CBS (que serão estimadas nas avaliações quinquenais das mudanças a partir de 2030) não pode superar 26,5%.

Caso as estimativas ultrapassem esse patamar, o Executivo federal deverá encaminhar ao Congresso um PLP para propor “a diminuição das reduções de alíquotas” já previstas.

Os estados e municípios terão autonomia para estabelecer a sua alíquota parcial de IBS. A emenda constitucional da reforma, promulgada no final do último ano, prevê que a alíquota de referência para cada ente federativo será definida pelo Senado, mas só será aplicada na ausência de lei local específica.

Como a alíquota de referência não precisa ser seguida, muitos setores econômicos ficaram com receio de que estados e municípios pudessem estipular patamares elevados de tributação. Por isso, pediram um teto.

Passagem pelo Congresso

Na visão de Cristiano Luzes, sócio do escritório Serur Advogados, a medida é “bastante saudável”, pois indica que a discussão deverá passar pelo Congresso “antes de se cogitar por aumento da alíquota de referência”.

Com isso, ele vê o caminho aberto “para uma tributação mais uniforme, que sempre foi o propósito do modelo de IVA a ser implantado no Brasil”.

Por outro lado, o advogado ressalta que a aplicação desses limites “dependerá sempre da vontade política do Congresso”. Ou seja, não há garantia de segurança jurídica sem a colaboração do Legislativo.

Ana Carolina Monguilod, sócia do CSMV Advogados, considera “muito saudável” a preocupação com a alíquota, mas também ressalta que “a proposta poderá acabar sendo inócua” por depender de uma lei complementar.

Ainda segundo ela, a medida pode “gerar contencioso se efetivamente implementado o reequilíbrio”.

Na mesma linha, Morvan Meirelles Costa Junior, da banca Meirelles Costa Advogados, critica o fato de a trava se basear na “mera possibilidade de sua revisão pelo Poder Executivo via PLP”.

Ele destaca que a proposta prevê como obrigação apenas a apresentação do “projeto de redução de diferenciações”, sem um prazo para isso e muito menos para deliberação e aprovação.

“Pensando em segurança jurídica, o mecanismo deveria prever a obrigatoriedade de revisão tendo como limite a alíquota de referência somada de 26,5%, além de prazo para esse trâmite (ou ao menos para apresentação do respectivo projeto).”

Outra possibilidade, segundo Costa Junior, seria determinar que a pauta do Congresso fosse travada até a análise do PLP. Mas nada disso está previsto no texto atual da regulamentação.

Altos e baixos

No entendimento de Daniela Teixeira, do escritório Bento Muniz Advocacia, o teto de 26,5% “representa segurança jurídica ao impedir o aumento da carga tributária relativamente a esses tributos para compensar desonerações”.

Por outro lado, ela acredita que a garantia vinculada a uma “proposta de diminuição das reduções das alíquotas previstas para diversos setores no mesmo projeto” traz “insegurança e risco de aumento da tributação para os referidos segmentos”.

Isso porque, para alguns desses setores, “as reduções foram estabelecidas justamente com o objetivo de viabilizar a manutenção da carga tributária atual”.

O texto ainda estabelece que a diminuição das reduções das alíquotas “poderá ser diferenciada por produtos ou setores, motivando incerteza quanto aos efeitos da medida proposta”, de acordo com Daniela.

Para Victor Hugo Rocha, diretor jurídico do movimento Destrava Brasil (que defende uma reforma tributária ampla e definitiva), “é inegável que a fixação de um limite para a alíquota do IVA traz um certo grau de segurança jurídica, ao evitar oscilações extremas que possam desestabilizar o ambiente econômico”.

No entanto, ele diz ser “igualmente crucial que o sistema tributário se mantenha flexível e adaptável às mudanças socioeconômicas e regionais”. De acordo com o advogado, a imposição de um teto deve ser “um passo intermediário em direção a um sistema tributário mais equilibrado”.

O objetivo a longo prazo “deve ser a transição gradual da matriz arrecadatória, reduzindo a dependência sobre a base consumo e ampliando a tributação sobre renda e patrimônio, uma vez que estes são mais adaptáveis ao conceito da progressividade”, segundo Rocha.

Por isso, ele acredita que a trava de 26,5% “deve ser acompanhada de um esforço contínuo para aprimorar o sistema tributário brasileiro, adaptando-o às peculiaridades regionais e promovendo uma maior conscientização tributária entre os consumidores”.

Fonte: José Higídio – Conjur